Devedor Solidário

Muitas empresas não têm seu cadastro de clientes e fornecedores atualizados ou com informações corretas, e estão sujeitas a serem “devedores solidários” por negociarem com empresas em situação irregular perante a Receita Federal, Fazendas Estaduais ou Agências setoriais reguladoras, como a Anvisa. Com a informatização dos sistemas fazendários de controle fiscal, o risco das empresas serem autuadas aumentou, com a novidade de que a multa pode chegar ao contribuinte como uma multa de trânsito, pelo correio.

Diante da complexidade do ambiente fiscal, duas questões importantes estão sendo muito pouco discutidas na nova Era da Informação Fiscal: a consulta cadastral e o saneamento de dados.

A realidade do cadastro das empresas brasileiras é problemática, justamente pela falta de saneamento e atualizações dos dados em bases públicas de consulta. “Infelizmente o que importa hoje para algumas empresas é que a mercadoria ou serviço cheguem ao cliente e a fatura no endereço certo”, comenta Sérgio Di Pierro, gerente de negócios da SIM>Consultas. Mas a realidade fiscal atualmente é mais complexa e esse descuido pode gerar transtornos para as empresas. Segundo a pesquisa divulgada pela consultoria fiscal IOB, na qual foram ouvidas 405 corporações brasileiras com faturamento entre R$ 3 milhões e R$ 7 bilhões, 83% dos entrevistados cometeram algum equívoco nestas áreas em 2007, sendo que 56% realizaram transações com fornecedores ou clientes inabilitados pelo governo.

Hoje as exigências aumentaram e, além de atender as antigas questões legais como o Código Tributário Nacional, IN RFB no.748 (CNPJ) e a Legislação ICMS estadual, as empresas também devem se adequar ao ambiente Fiscal do Sped que inclui SPED Fiscal e Contábil, a Nota Fiscal Eletrônica (NF-e) e o Conhecimento de Transporte Eletrônico (CT-e).

Com a rede de comercialização das empresas vigiada em todos os níveis (financeira, fiscal, e contábil), um fato tem ganhado destaque nos processos de autuação pelo fisco, que é a figura do devedor solidário, descrita na legislação do Código Tributário Nacional – Lei n° 5.172, artigos 124, 134 e 135. Isto acontece quando empresas mantêm relações com contribuintes inaptos e, dependendo da avaliação, a empresa pode ser qualificada como co-participante (devedor solidário) ou até mesmo ser responsável direta.

Em 2008, uma grande empresa do setor da construção civil foi autuada por se encaixar no perfil de devedora solidária em uma transação comercial. A empresa em questão foi autuada, pagando parte da multa, por receber mercadorias de outra que estava inabilitada no cadastro de ICMS do Rio de Janeiro.

Vale lembrar que além do Código Tributário Nacional, que também possui instrumentos legais punitivos, cada estado possui uma legislação específica para o ICMS. Um exemplo no Nordeste ilustra bem o caso. Uma empresa no Sergipe emitia notas fiscais para uma outra na Bahia, esta última inabilitada segundo informações da SEFAZ-SE. Nesse caso o auto de infração foi confirmado pela Primeira Câmara de Recursos Fiscais do Sergipe baseado no artigo 72, inciso I, alínea “c”, da Lei n. º 3.796 de 26 de dezembro de 1996, onde a empresa que emitiu as notas fiscais foi obrigada a pagar 50% do valor devido pela empresa infratora e devolver o crédito com correção e juros.

Comparado ao faturamento anual dessa empresa, que atua há 94 anos no mercado de tecidos, uma multa de 60 mil reais pode ser pouco, mas soma-se ai o volume de negócios, a infinidade de fornecedores, parceiros comerciais e uma consulta cadastral ineficiente para que esse bolo aumente exponencialmente. Além do prejuízo material a empresa pode ter problemas com a sua reputação no mercado onde atua já que o acesso a processos e autuações de empresas pelo fisco também são de consulta pública.

Di Pierro faz uma comparação simples e eficiente. “Antigamente éramos multados pelo guarda rodoviário quando ele nos pegasse, com a implantação dos radares nas estradas passamos a receber a multa em nossa casa”. O SPED se tornou um radar da Receita Federal, onde ela pode apenas emitir a notificação da multa, sem a presença do fiscal. “Apesar das exigências serem muito grandes, quase como uma mudança cultural dentro das empresas, a realidade da digitalização pode aplicar sanções quase que imediatas, dificultando trabalhos rotineiros, operacionais e interferindo em seu faturamento”, completa Di Pierro.

Reportagem e Edição de Renato Couceiro.